domingo, 24 de maio de 2009

Quando pequena me alimentava de pimenteira brava, dizia minha avó, comia jiló imaginário, era marrenta, cruzava os braços, travava os lábios e me recusava a chorar. Recusei peito e leite materno, aprendi a tomar café quente, frio ou gelado com meu avô, a brigar com irmão mais velho, escalava parede subindo pelos batentes das portas, corria na rua sem camisa, andava de carrinho de rolimã. Estourei dois dedos em caixa de espoleta, explodia formigueiro no sítio, subia no telhado, subia em árvore pra pular segurando folhagem achando que ia voar, cortava cabelo das bonecas. Corri com febre alta, ralei joelho e infeccionou por meses, peguei sarampo com 16 - o que estragou minha saúde mas tudo bem - já dei soco na cara de namorado, mordi lábio de outro até sangrar, fui segurada pra não pular em pescoço de diretor, arranquei maçaneta de camarim, quebrei box de banheiro com chute.
Hoje sou calma, gosto ainda de chupar limão azedo, comer mostarda de colher, falar palavrão a torto e direito quando puta da vida, fazer serviço de manicure com os dentes, cutucar casca de ferida. Hoje eu choro de raiva, choro também de dor sentida, ainda tenho ganas de pular em pescoço alheio, mas me tornei civilizada, enquadrada, burocrática. Estou voltando ao ciclo da gripe constante.

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